quinta-feira, novembro 16, 2006

CAIO F. & RENATO R. E 1996



















O ano de 2006 completa dez anos da morte de dois ícones de nossas letras, um da área literária e outro da área musical, mas ambos da arte poética.

Caio Fernando Abreu faleceu em fevereiro de 1996 e Renato Russo em outubro do mesmo ano. Para mim foi estranho perder assim, no mesmo ano, dois ídolos recém acolhidos para a minha árvore de referências e influências nos idos dos meus 16 anos. E pela mesma causa: ambos HIV. Naquele ano, estava lendo intensamente a obra de Caio Fernando Abreu (contos, romances, teatro). Entre 1995 e 1997, simplesmente li toda a obra desse escritor que mudou minha forma de interpretar as coisas e, sobretudo, determinou um jeito de escrever que ainda estava - ainda estou - fortalecendo. Me lembro bem, em 1995, quando minha irmã e minha vó chegaram juntas e me entregaram o livro Ovelhas Negras, que reunia os contos que Caio havia condenado à gaveta durante 30 anos de sua obra. A partir daí foi um atrás do outro: Limite Branco, Pequenas Epifanias (lançado em 1996), Dulce Veiga, Pedras de Calcutá, Invetário do Irremediável, Os Dragões não conhecem o Paraíso, O ovo apunhalado, Morangos Mofados. E Triângulo das Águas, que me arrebatou, pela estrutura (3 novelas sobre cada signo de água) me deixou satisfeito com o fato da novela que abre o livro, Dodecaedro, ser referente ao signo de peixes, que é o meu, e ser dedicado a Ana Cristina César, outra autora que celebro. Em 1997 li todo o teatro de Caio (lançado naquele ano) em poucas semanas. Caio sabia dominar as técnicas: conto, romance, teatro. Cada texto, cada frase, eu lia como prazer, e descobria a poesia de cada sentença. Tudo o que Caio representa pra mim pôde ser lido num texto-crônica que escrevi no ano de sua morte e publicado no jornal Zero Hora, com o título: a Canção de Caio Fernado Abreu, no ano da sua morte, esse texto sintetizava tudo o que na hora eu sentia e o que provocou sua partida, assim como uma referência poética que me acompanha até hoje.

Caio permanece, aceso. E me vigia de perto, presente.

Renato Russo, eu ouvi o número de vezes equivalente a leitura de Caio. E sua obra interfere no que tento fazer em literatura tanto quanto Caio F. interfere. Variações do Mesmo Tema. As letras de Renato Russo são poemas que se ouvem e que ficam dentro aqui, como mantras existencias. Tanto quanto são as letras, a voz de Renato sabe expressar e chega longe. O canto dele nos mantém vivo. Os discos lançados pela Legião Urbana eu convivi como quem se relaciona com livros. A presença e o lirismo de Renato Russo ensinam, e sinceramente fortalecem, causam um impacto típico daquilo que a canção causa, porém consegue ser mais que isso: são também leitura de textos, poesia que se faz presente pelo canto, pelo som. Dessa forma, Renato Russo está pra mim no time das referências literárias.

No ano de 1996, eu estava em formação - sempre estamos - e ainda estou, porém agora mais determinado, mais seguro mesmo, capaz de determinar o que me influencia. Naquele ano eu estava me aprofundando nesses nomes, descobrindo, convivendo, me alimentando. E eles se foram durante esse trajeto, na verdade isso aumentou o caráter de mito que eles me ficaram, distantes, intocáveis, impossíveis de estabelecer um diálogo, de me mostrar pra eles. Reconhecer isso como algo impossível me foi drástico. Naquele ano de 1996. Hoje estou resignado, certo de que, lendo, ouvindo, lembrando deles, é certamente uma forma de me relacionar.