terça-feira, março 18, 2014

LADODENTRO ENTREVISTA - FABRÍCIO CORSALETTI

O escritor e poeta Fabrício Corsaletti gentilmente respondeu, e rápido, algumas perguntas sobre seu mais recente trabalho: Quadras Paulistanas, lançado ano passado pela Companhia das Letras. O livro já foi tema de uma das postagens deste blog e recupera de forma criativa o formato quadra, misturando crônica e poesia destacando aspectos cotidianos da cidade de São Paulo. O olhar do autor está atento a cada detalhe de Sampa, vê-se que o Corsaletti é íntimo da megalópole. Nessa conversa, o autor comenta mais sobre seu projeto mais recente e o processo de elaboração da obra. Confere aí.



O que motivou o formato do poema em quadra para compor a série do livro?
Minha coluna quinzenal na revista "São Paulo", do jornal folha de São Paulo. Com a brevidade das quadras, descobri que poderia tratar de muitos assuntos, assuntos sobre os quais talvez eu não tivesse mais do que 4 linhas pra falar.

No seu ponto de vista, além do aspecto sonoro e da brevidade, quais outros aspectos da quadra são propícios a uma função poética de linguagem?
A rima é algo que me atrai. E ela se sobressai, ganha uma força enorme na quadra.

Você concorda que a quadra é um modo de aproximar a poesia do leitor comum? (até pelo histórico popular da tradição da forma) e também pela estrutura lúdica, sonora, com um apelo comunicativo, a ponto do poema/quadra soar próximo a um slogan publicitário?  
Sim. Mas não vejo a quadra tão próxima do slogan publicitário. Penso que tem mais a ver com a infância das pessoas, com o batatinha quando nasce e coisas assim. 

Em Quadras Paulistanas o cotidiano é um tema relevante, do mesmo esse tema é recorrente em sua poesia de um modo geral. Quais outras marcas da sua poética estão presente também em Quadras Paulistanas?
Não sei. Não me preocupo com isso. E acho que um artista não deve avaliar o próprio trabalho. Essa é a tarefa do leitor, do crítico.

Existe alguns teóricos que lhe comparam a poesia moderna a partir das propostas de 1922, a concisão, o coloquialidade, o humor, típicos de Oswald de Andrade ou aos primeiros livros de Drummond, você concorda que suas Quadras são influenciados por esses exemplos? 
Sim. Sempre acreditei que eu não teria escrito um único verso na vida se não tivesse lido os poetas modernos brasileiros.

 Em sua poesia não é comum a utilização exagerada de metáforas ou um rebuscamento de linguagem, se dá mais através do efeito, nesse sentido é como se fosse uma prosa distribuída habilidosamente em versos? ou seja, você evita o "poema" para fazer sua poesia?
Sim e não. Leio muita prosa e imagino que minha escrita seja influenciada por ela. Desde os 25 anos eu próprio escrevo prosa - tenho um livro de contos, uma novela, crônicas. Quanto à minha poesia... sei que tenho usado poucas metáforas, mas a verdade é que não penso mais nesses termos. Só quero saber se a imagem funciona, e essa imagem pode ser uma descrição, uma narrativa, uma comparação, uma metáfora etc. o nome não importa. Não gosto quando a metáfora se torna um ornamento, uma sobra. É a velha frase do Hemingway: "prosa é arquitetura, não decoração de interiores". Poesia pra mim também é isso.

Alguns autores dos quais você não consegue se livrar, mesmo que você disfarce, e sempre acabam conversando com seus textos. E alguns poetas da canção te dizem tanto quanto os poetas livrescos.
Eu não disfarço nada. Aceito minhas influências, minhas obsessões. Sou grato aos poetas modernos brasileiros, aos poetas compositores brasileiros, a Bob Dylan, aos prosadores norte-americanos (Hemingway, Faulkner, Fitzgerald, Carver, Salinger), a Rubem Braga, a Rimbaud, a Apollinaire etc. sem eles, eu não faria nada ou faria muito pior. Não penso neles quando vou escrever, mas sei que um ou outro sempre aparece nos meus textos. E está tudo bem. A criação não é pura. A pureza não é algo deste mundo.

 Não é de hoje, sua geração já trabalha tendo a internet como veiculação da obra. Você sugere que os autores novos antes de chegar ao livro devam circular na internet? até como um modo de perder o ineditismo? isso é válido, uma vez que a internet é um "vento onde tudo cabe".
A internet é maravilhosa nesse sentido. Não sugiro nada aos jovens autores porque acredito que cada um tem que encontrar seu caminho. A internet pode ser um deles - sei que é para muitos.

Uma de suas marcas é a abordagem da memória como um modo de resgatar uma outra identidade, ou reinventar a memória com sensibilidade lírica do presente. Isso foi uma decisão planejada ou poemas foram nascendo assim?
Foram nascendo assim.

Em suas práticas de oficina literária, o que costuma repassar aos alunos?
 De poesia, dei apenas duas oficinas. Li com os alunos poemas que me agradavam e mostrei a eles por quê. Depois cada um escrevia o que quisesse e discutíamos os textos produzidos. Fico um pouco tímido em oficinas de poesia. É como se estivesse esquartejando minha mãe em público. Mas nas de prosa me sinto à vontade. Tenho muitas aulas preparadas sobre aspectos da linguagem que me interessam, como precisão, descrição, estranhamento, e outras em que analiso contos de autores que admiro lendo-os junto com os alunos.